Foto: Museu Parque Seringal (Adrielson Furtado, 2013) |
A identidade de uma nação também
pode ser definida pelos seus monumentos. Esses bens constituem um tipo especial
de propriedade: a eles se atribui a capacidade de evocar o passado e, desse
modo, estabelecer uma ligação entre passado, presente e futuro. A identidade é o sentimento de pertença a uma comunidade imaginada cujos
membros não se conhecem, mas partilham referências comuns.
Assim, tudo que o homem produziu durante anos é importante porque conta a sua
origem e diz quem ele é.
Uma cidade é identificada pelo
seu povo que a constrói ao longo dos tempos. Ananindeua já foi identificada
como um pequeno povoado ao longo da estrada de ferro de Bragança, cidade
dormitório de Belém no século XX. Hoje, Ananindeua é conhecida pelos eventos
culturais promovidos pelo poder público. Pelo trecho da BR-316 que mais sofreu
urbanização. 2° maior município paraense em termos populacionais.
Durante o seu processo de
ocupação territorial, recebeu pessoas vindas de outros lugares, trazendo
consigo sua cultura, sua história. Nessa “miscigenação cultural” acabou
por ficar em segundo plano a própria história do município e seus aspectos
relevantes. Caracterizando assim sua perda da identidade cultural.
A seguir será apresentado, por
meio de uma cronologia histórica, o contexto que se desenvolveu seringais de
Ananindeua, que resultaram na criação e instalação do Museu Parque Seringal. Permitindo
que cada cidadão possa tomar conhecimento da sua importância e seus respectivos
valores históricos, culturais e naturais. Fortalecendo os laços de identidade
da comunidade com o lugar.
Em 1871, o Pres. da Província do
Pará anunciou o 1° lugar da borracha na pauta de exportação. De 1870 a 1910 a
“Economia da Borracha” será considerada como o maior surto econômico já
verificado na região. Na década de 1870, a Índia Office junto com um jardim
botânico da Inglaterra coordenaram uma ação para coleta de sementes, plantio e
envio de mudas para uma plantação experimental no sudeste asiático. Em 1876, o
inglês Henry Wickham coletou e enviou da região do Tapajós e Madeira 70.000
sementes para Jardim Botânico da Inglaterra. Destas, 7 mil brotaram nos
viveiros, sendo transportadas para a Ásia (FILHO; JÚNIOR; NETO, 2000).
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Foto: Sementes de seringueira (Adrielson Furtado, 2014) |
Em 1883, na construção da Estrada
de Ferro de Bragança (EFB), iniciou-se a instalação da oficina dos trens, e uma
Vila operária, que deu origem ao povoado de Ananindeua. Em 1884, com a
inauguração do 1° trecho da EFB, os moradores do povoado passaram a retirar
lenha nas matas próximas para abastecer as Maria Fumaças. Outras áreas em
Ananindeua também passaram a fornecer lenha e postes para a rede de iluminação
de Belém, como as “Matas do 40 horas”, que depois transformaram-se em grandes
áreas de capoeiras.
Em 1913, todo o látex produzido
na Amazônia foi superado pela produção Asiática. Na Amazônia não havia razão
para investir capital pesado na exploração racional do cultivo da borracha
(produção extrativista). O retorno do cultivo de uma seringueira apta para o
corte era no mínimo 5 anos. Por esse motivo, as plantações de seringueiras na
Amazônia foram bastante reduzidas. Assim, Amazônia perdeu o monopólio da
borracha e sua economia entrou colapso (FILHO; JÚNIOR; NETO, 2000).
Em 1916, os sócios Saunders e
Arthur Davids adquirem a propriedade do curtume Maguary, que pertencia ao
português Mário Almeida. O Curtume progrediu ao longo dos anos, sua Vila
Operária ficou conhecida como Vila Padrão na época. Os lucros obtidos com a
atividade, permitiu que os proprietários do Curtume comprasse as propriedades
vizinhas. Assim a propriedade do Curtume Maguary abrangia as terras dos atuais
Conj. Cidade Nova, Guajará e PAAR (LEÃO, 1999).
O acesso ao Curtume dava-se
inicialmente pelo rio Maguari. Em 1926, o Sr. Saunders mandou construir uma
estrada dentro de suas terras, passando pelas Matas do 40 Horas através da
estrada da Providência até a EFB. No final da estrada havia uma casa do
Curtume, onde morava a Dona Luiza, que tinha a função de verificar as
autorizações para passar pelo portão (área próximo ao viaduto do Coqueiro)
(LEÃO, 1999).
Em 1929, o Pará recebeu as
primeiras famílias de imigrantes japoneses, visando solucionar o problema de
despovoamento e produção agrícola. Com a 2° Guerra M. (1939-1945), houve a
expansão militar japonesa sobre o território asiático. Em 1942, os japoneses já
controlavam 95% da produção mundial de borracha. Amazônia tornou-se alternativa
de abastecimento de látex. Em 1942, o Governo brasileiro e os EUA assinaram os Acordos
de Washington, que visavam o fornecimento de borracha. Permitindo o
erguimento da economia gomífera na região (FILHO; JÚNIOR; NETO, 2000).
Nesse período, os japonese
iniciam nas Matas do 40 Horas as primeiras plantações de seringueiras. Na década de
1940, a população belenense passa a estabelecer-se em nos novos bairros ao
longo da EFB até adentrarem ao atual território de Ananindeua. Em 1944,
Ananindeua torna-se Município.
Com o fim da 2° Guerra M. em
1946, os japoneses foram expulsos da Ásia, normatizado o mercado de látex. Os EUA
não renovaram os compromissos do Acordo de W., deixando de importar o látex
brasileiro (FILHO; JÚNIOR; NETO, 2000).
Na década de 1950, no Coqueiro já
haviam moradias rurais dedicadas às atividades de subsistência. Em 1952, várias
famílias de imigrantes japoneses chegaram e se estabeleceram no Pará, buscando
melhores condições vida e, fugindo da crise no Japão provocado após a II Guerra
Mundial.
Na década de 1960, as
propriedades rurais começaram a ganhar definições com a organização do espaço. Motivados
pela instalação dos clubes recreativos, retiros, sítios (frutíferas), granjas,
hortas, plantações de cacau, cupuaçu em consórcio com seringueiras. Esse uso
rural-produtivo era realizado por famílias descendentes de japoneses e
nordestinos.
Os nordestinos chegaram ao Pará
nos seguintes momentos: a) 1877 a 1889 – 20.000 imigrantes nordestinos chegaram
em Belém fugidos da seca; b) Em 1943, a falta de mão-de-obra para trabalharem
nos seringais levou ao recrutamento dos nordestinos (Soldados da Borracha); c) Em
1962, com a recuperação econômica do Japão, chegaram os últimos japonês no
Pará. Nesse período, algumas plantações, hortas e seringais começam a ser
abandonados por seus proprietários, sendo coletados por comunidades próximas (FILHO; JÚNIOR; NETO, 2000).
Na década de 1970, a COHAB-PA
planejou o conjunto Cidade Nova. Dentro de uma política social de Governo, sob
o discurso da habitação para a população de baixa renda. A COHAB-PA inicia o
processo de compra dos primeiros terrenos para a implantação do conjunto. Alguns
japoneses venderam parte de seus terrenos, para continuar morando local. Alguns
desses terrenos foram invadidos por volta de 1985 perdendo seus seringais
(invasão do Tóquio).
Os últimos seringais encontram-se
no Complexo Esportivo do VIII, Condomínio Firenze. Aos poucos o espaço
rural–produtivo foi transformando-se em urbano-habitacional. No planejamento da
COHAB, não foram urbanizados alguns seringais, que foram ao longo dos anos
preservados pela população.
Em abril de 2012, o seringal na
Cidade Nova VIII foi transformado em Museu Parque Seringal. Passando a ser o
segundo parque ambiental de Ananindeua e, a primeira Unidade de Conservação
Municipal do Pará. Fazendo parte do Cadastro Nacional de Museus pelo Instituto
Brasileiro de Museus (IBRAM) do Ministério da Cultura. Bem como, do Cadastro
Nacional de Unidades de Conservação (CNUC) do Ministério do Meio Ambiente.
Entender o passado não é tarefa
fácil, principalmente quando as informações perderam-se no momento que as
pessoas deixaram de narrar. O tempo apaga alguns vestígios, ou substituiu por
outros. Manter a memória viva é como montar um quebra-cabeça. Conectando o
passado ao presente utilizando as coleções existentes. Ajudando a manter nossos
laços de pertencimento ao lugar, reforçando nossa identidade. Unindo-nos na
busca da preservação do que é Nosso.
Nossa Herança. Nosso Patrimônio.
Nosso Seringal.
Texto da palestra intitulada de “A
importância da identidade patrimonial para a comunidade”, proferida no Parque
Museu Seringal (Ananindeua), durante a realização da 12º Semana Nacional de
Museus (17 de maio de 2014).
Referências:
CHAUÍ, Marilene. Convite à filosofia. São Paulo:
Ed. Ática, 2001.
FILHO, Armando Alves; JÚNIOR, José Alves; NETO, José Maria. Pontos de História da Amazônia,
volume II. 2 ed. Belém: Paka-Tatu, 2000.
LE GOFF, Jacques. História e memória. Campinas, SP Editora da UNICAMP, 1990.
LEÃO, Roberto Queiroz de. Maguary: vôo ao seu passado. Ananindeua, 1999.
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